Indígenas e indigenistas da USP escrevem manifesto contra o etnocídio na universidade
Manifesto Indígena
Diante da política de apagamento indígena, pensada, organizada e praticada pelo ESTADO dizemos não a esse apagamento. Nós, alunas e alunos da USP da graduação, pós graduação e indígenas interessados no ingresso nesta universidade, estamos somando força para combater todas as formas de etnocídio cometidas nessa Universidade que ocorrem contra nós.
Neste manifesto estão indígenas e aliados, indo na contramão da política de apagamento indígena de Estado que se mostra gritante nesta Universidade. Uma universidade sem nenhuma política de afirmação para Povos indígenas que garanta acesso aos cursos de graduação e pós graduação, nem condições de permanecer na universidade.
Sabemos que o departamento de Antropologia tem tomado iniciativas para garantir cotas étnico-raciais para indígenas. Também realiza atividades de formação e debates referentes à educação escolar indígena junto a Povos Indígenas. Nós apoiamos essas ações e reivindicamos das instancias responsáveis que aprovem as cotas étnico-raciais para o curso de Antropologia em tramite, porém reivindicamos que todos os demais departamentos e unidades também adotem a mesma política de acesso à universidade para os Povos Indígenas, considerando suas especificidades.
Nossas rodas de conversa na USP correspondem com esse debate entre as bases do movimento indígena, também enfatizado por Gersem Baniwa em seus posicionamentos sobre o acesso de indígenas ao ensino superior. Esse acesso não é apenas um direito: é também uma necessidade. Não se trata apenas de garantir a capacidade interna das comunidades indígenas para gerir seus territórios, suas coletividades étnicas e suas demandas básicas por políticas públicas de saúde, educação, autosustentação, transporte, comunicação, mas também de lhes dar condições de cidadania plena e diferenciada para dialogar com o Estado e com a sociedade nacional no que tange a interesses comuns e nacionais, como, por exemplo, a contribuição econômica dos territórios indígenas, a relevância da diversidade cultural, étnica, linguística e da sociobiodiversidade indígena, que são também patrimônio material e imaterial da sociedade brasileira.
Nós queremos fazer parte dessa universidade e pautar nossas questões. Não apenas assimilar teorias, queremos colocar em diálogo nossos saberes. Queremos contribuir com a presença e atuação da diversidade cultural nessa universidade. Entendemos que a formação superior de indígenas reveste-se de importância estratégica também para a construção de espaços e experiências de convivência multicultural entre Povos Indígenas e a sociedade nacional, capazes de garantir harmonia, paz e tranquilidade sociopolítica, levando-se em consideração a conformação recente do Brasil como um Estado pluriétnico e multicultural.
Os Povos Indígenas, organizados politicamente, lutam para fazer valer seus direitos, cobrando dos governos a constituição de um Estado diferente, que possibilite a igualdade de condições de vida para todas e todos. Para isso, contamos atualmente com convênios internacionais e leis nacionais para garantir nossos direitos. Os mais significativos são a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) ratificada pelo Brasil em 2004, a Declaração das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos dos Povos Indígenas, adotada em setembro de 2007 pela Assembleia Geral da ONU, e a Constituição Federal de 1988, que asseguram os direitos coletivos dos povos indígenas.
Queremos uma resposta dessa Universidade para nossas reivindicações. Aguardamos a garantia de um debate com representações do movimento indígena para a construção dessa política específica e diferenciada para os Povos Indígenas.
Queremos que as pautas indígenas façam parte dessa universidade, para isso faz se necessário que as representações indígenas respeitando a diversidade cultural e lingüística sejam garantidas na Universidade do Estado de São Paulo. Lembrando também da obrigatoriedade de incluir no programa de ensino dessa universidade a Lei 11. 645/2008.
Não ao etnocídio na USP!
Movimento Levante Indígena na USP
20.04.2016
Apoio: Núcleo Indígena/USP e aliados